quarta-feira, 30 de abril de 2008

A música não tem tempo nem época

Dori Caymmi e Joyce apresentam Rio-Bahia com grande estilo

São muitos os que pensam que o filho do grande Dorival Caymmi é baiano. Mas o fato é que um dos mais importantes compositores e arranjadores da Música Brasileira é carioca, porém criado na Bahia desde cedo.

Já a cantora Joyce é nascida e criada em Copacabana. Quando ingressou na música seu primeiro arranjador foi nada mais nada menos que Dori Caymmi.

Quarenta anos se passaram e os dois resolveram lançar, no Rio de Janeiro, o CD Rio-Bahia, com novas e velhas composições da dupla, como Saudade do Rio (Dori Caymmi / Paulo César Pinheiro) e Saudade da Bahia (clássico de Dorival Caymmi), e novas parcerias, como a de Joyce e Carlos Lyra, em Era Copacabana, e Dori e Chico Buarque, em Fora de Hora.

Produzido em 2005 para as gravadoras Far Out, de Londres, e JVC, de Tóquio, o CD foi gravado nos estúdios Mosh, em São Paulo. Mas só agora a dupla apresenta este belo trabalho, repleto de Samba e Bossa, que ainda conta com a participação do consagrado jazzista americano Kenny Werner, no piano, além do baixo de Rodolfo Stroeter, da bateria de Tutty Moreno, dos sopros de Proveta e Teco Cardoso, que juntamente com o percussionista Ronaldo Silva, forma a base instrumental do álbum.

Com um jeitão simples e sorridente, Dori Caymmi elogia muito o CD e sua parceira.

“Quando eu era menino o meu apelido era baiano e por isso a Joyce resolveu colocar Rio-Bahia”, explica.

O cantor confessa que é bom trabalhar com a Joyce. Para o irmão de Nana e Danilo Caymmi, a cantora seria uma quarta irmã.

“Somos irmãos de músicas, de pais da música, temos as mesmas influências, a gente veio das mesmas rodas e isso é muito importante”, completa.

Um pouco mais tímida, Joyce também se rasga de elogios a Dori.

“É uma delícia trabalhar com o Dori. Ele é meu ídolo. Ele foi o meu primeiro arranjador e o primeiro a gente nunca esquece (risos)”.

Dori e Joyce vieram de uma época farta de bons músicos, como Roberto Menescal, Edu Lobo, Ronaldo Bôscoli e tantos outros. Mas os tempos são outros e, mesmo assim, continuam fazendo o que sabem de melhor: boas músicas.

Sobre o cenário musical de hoje, Dori não hesita em dizer que a velocidade e o mau gosto andam juntos.

“Hoje o mau gosto chega muito mais rápido do que naquela época. Antigamente as pessoas eram mais fáceis de lidar, elas não tinham tanta pressa. E era lindo morar no Rio de Janeiro. Hoje acabou-se um pouco o romantismo. Eu gosto é dessa arte do encontro com pessoas que a gente se entende, como a Joyce. Aí é muito bom”.

Já Joyce acredita que a época é a mesma.

“Estão todos aí. A música está muito viva, mesmo das pessoas que já foram, como o Tom. A música não tem tempo nem época. Quando ela é boa, seja qual for o gênero, ela é eterna”, filosofa.

Mas Dori acrescenta que o trabalho de toda essa safra não foi em vão. Ele comemora o fato de ainda existirem jovens interessados em ouvir MPB, ouvir Bossa.

Já Joyce lembra que a década de 60, no auge da Bossa Nova, grandes compositores passaram por dificuldades.

“Somos como a maré. Em um momento estamos lá em cima e, de repente, a maré baixa. Eu acho que temos que ver esta coisa com muita filosofia e trabalhar pela beleza da música para que ela sobreviva por muitos anos”.

Para a cantora o problema do Brasil é estrutural. Não há nenhuma educação musical e isso faz com que as pessoas percam a sensibilidade, a compreensão por uma música mais elaborada. Mas ainda há uma esperança.

“Eu acho que tem toda uma geração de filhos de pessoas da nossa época que estão fazendo um trabalho bonito e podem levar adiante nossa música porque tiveram exposição a ela durante toda a vida, como nós fomos”.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

O popular e o erudito na mais fina harmonia

Wagner Tiso, Beth carvalho, Carlos Prazeres e Diogo Nogueira
Noel Rosa ganha roupagem clássica e surpreende seus fãs em noite emocionante

Alguém já disse que “a música é a única coisa que atravessa todos os grupos étnicos e todas as línguas”. A Orquestra Petrobrás Sinfônica traduziu muito bem a frase do trompetista Lee Morgan na noite de ontem, no Canecão – RJ, ao homenagear Noel Rosa, junto com Diogo Nogueira e Beth Carvalho.

No primeiro momento o público pode estranhar o fato de a música popular ser orquestrada, ainda mais em um país não muito acostumado com o erudito. Mas, se estudarmos com carinho o nosso passado, lembraremos que um dos maiores maestros da história da música, Villa-Lobos, fez isso melhor que ninguém.

Noel Rosa, se vivo, faria 98 anos no mês de maio. Responsável pela união do samba do morro com o do asfalto, o poeta da Vila nos deixou cedo, em 1937, com apenas 26 anos de idade, vítima de tuberculose.

Para lembrar seu centenário, os maestros Wagner Tiso e Carlos Prazeres fizeram uma seleção de seus mais conhecidos sambas, como “Gago Apaixonado” e “Último Desejo”, e convidou Beth Carvalho e Diogo Nogueira para interpretá-los, em grande estilo, com a Orquestra Petrobrás Sinfônica, dentro do Projeto MPB&Jazz.

Em sua quinta edição, o MPB&Jazz começou dentro da Orquestra como uma programação extra de música popular. A empresária e produtora Giselle Goldoni Tiso convidou Túlio Feliciano para a direção e roteiro e o maestro Wagner Tiso para a regência.

Antes do show, que aconteceu no dia de São Jorge, o devoto do Santo, trajado com camisa vermelha com a estampa do dragão e all-star azul, Tiso falou, com muito orgulho, do projeto que mistura, há cinco anos, música popular e erudita.

“O maestro Carlos Prezeres está comigo desde o início e a gente fazia um movimento de música popular com a Orquestra Sinfônica dentro de um grupo de convidados, tanto solistas como intérpretes. Mas há dois anos estamos fazendo a série em conceitos”.

Entre os homenageados do projeto estão Pixinguinha e João Bosco. E Tiso falou sobre como é feita esta seleção.

“Ano passado a gente fez Cem Anos de Frevo. Depois fizemos uma homenagem à obra de Edu Lobo e este ano pegamos dois compositores cariocas, que são o Noel Rosa, que faria 98 anos agora, e, no segundo semestre, Jacob do Bandolim, que faria 90 anos. Então o conceito é este: homenagear uma figura ou um estilo”.

Perguntado sobre a importância de Noel Rosa para a MPB, Tiso lamenta sua morte prematura, mas se orgulha de sua obra.

“Eu conheço o Noel desde menino. Ele sempre foi um grande compositor de sucesso, morreu muito jovem, aos 26 anos, e deixou uma obra imensa, de grande valor, tanto de qualidade musical como de poesia. Ele foi o primeiro dos grandes compositores brasileiros a reunir poesia com canção popular. Chico Buarque, por exemplo, é descendente de Noel Rosa’.

Atento à entrevista, o maestro Carlos Prazeres também deu sua opinião sobre o Projeto.

“Analisando pelo lado sinfônico, pelo lado erudito, nós, que trabalhamos com isso, quando lidamos com um Projeto como esse é uma coisa completamente nova. Você dá à música popular uma roupagem clássica e temos que provar que não existe música clássica nem popular, existe é música boa e música ruim. Então a gente faz música boa, independente de ser música clássica ou popular”.

Orgulhoso de trabalhar com a Orquestra Petrobrás Sinfônica, Carlos acredita ser um projeto inovador, pois faz da música popular uma série oficial dentro da sua proposta de séries, que inclui a parte erudita em sua maioria.

“A gente pode dizer que, neste sentido, é uma orquestra pioneira. Eu fico muito feliz por esse trabalho ser feito pelo Wagner Tiso, que é esse mestre tanto do clássico como do popular e a gente pode confiar sempre nele”, completa.

Prestes a subir no palco, Wagner termina a entrevista explicando essa relação entre o erudito e o popular.

“O povo vem para ouvir as músicas que ele conhece, populares, e se surpreende com o som sinfônico. E quem gosta de orquestra vem aqui e se surpreende com a música popular dentro do som sinfônico. E trabalhar nessa fronteira é de maior importância. Villa-Lobos fez isso, não há nenhuma novidade, grandes compositores já fizeram e a gente consegue fazer também”.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Crítica: Pecados Inocentes

Promiscuidade e incesto são temas abordados no chocante filme que conta a história real do assassinato de Barbara Daly Baekeland, cometido por seu próprio filho, Tony (Eddie Redmayne), ocorrido em Londres em 11 de novembro de 1972.

Baseado no livro Savage Grace, Pecados Inocentes é estrelado por Julianne Moore, no papel de Barbara, uma bela e charmosa atriz que se casa com o rico empresário Brooks Baekeland (Stephen Dillane) e faz de tudo para se adaptar ao seu meio social.

O casal tem um filho, Antony, desde cedo idolatrado pela mãe. É ele, aliás, que narra a história. Quando adolescente, suas relações homossexuais revoltam seu pai, que o despreza e abandona a família. Mãe e filho vivem então um para o outro, numa cumplicidade que chega a ser doentia.

Barbara é uma mulher completamente instável, o que se vê desde o início e que piora com o tempo. Tony é um homem confuso, que não sabe bem o que é. Ele sofre com o desprezo do pai e os descontroles da mãe. Sempre de mudança, a única coisa na qual se apega é a coleira do cachorro que teve quando criança. E é esse pequeno fator que vai iniciar a discussão que o leva a matar Barbara.

O assunto é tão delicado que o filme demorou pelo menos oito anos para ficar pronto.
Mas o que ajudou muito foi o fato de o diretor Tom Kalin abordar a tragédia de Barbara num tom suave, sem transformá-la em um monstro.

Pelo contrário. O que o público observa é uma linda mulher, que de repente conseguiu um status por se casar com um homem bem sucedido, mas descobre que nada disso a livra da depressão e da promiscuidade. O mais intrigante é que Barbara não enxerga maldade em seus atos, principalmente com o filho. Para ela é apenas proteção.

Mas Kalin está acostumado com esse tipo de tema. O diretor gosta de abordar assuntos como homossexualidade e Aids. Seu trabalho tem sido aclamado pela crítica e recebido vários prêmios e indicações, incluindo honrarias do Festival Internacional de Cinema de Berlim, Festival de Cinema de Sundance e outros festivais de cinema de diversidade sexual. Kalin ganhou o Gotham Awards Open Palm Award (por Swoon - Colapso do Desejo) e foi indicado para dois Independent Spirit Awards.

Pecados Inocentes é seu último trabalho, após 15 anos sem filmar um longa-metragem. O filme está para estrear em 25 de abril.

Ficha técnica

Título original: Savage Grace
EUA, 2006, 97 minutos
Gênero: Drama
Direção: Tom Kalin
Roteiro: Howard A. Rodman, adaptado do livro homônimo de Natalie Robins e Steven M.L. Aronson
Fotografia: Juan Miguel Azpiroz
Edição: John F. Lyons
Distribuição nacional: California Filmes

Elenco

Julianne Moore - Barbara Daly Baekeland
Stephen Dillane - Brooks Baekeland
Eddie Redmayne - Tony Baekeland
Barney Clark - Tony criança
Elena Anaya - Blanca
Belén Rueda - Pilar Durán
Abel Folk - Carlos Durán
Hugh Dancy - Sam Green
Unax Ugalde - Black Jake

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Crítica: O Homem da Cabeça de Papelão

Cabeças e relógios querem-se conforme o clima e a moral de cada terra

Um homem é criticado por ser honesto e resolve trocar sua cabeça por uma de papelão. Essa é a história de Antenor, em O Homem da Cabeça de Papelão, conto de João do Rio, em cartaz no Leblon.

Adaptada por João Batista e interpretada pela Cia. Dramática de Comédia, a história data do início do século XIX, mas parece que foi escrita nos dias de hoje tamanha a atualidade.

Oberdan Junior – cuja voz é inconfundível – está muito bem na pele de Antenor, o homem que só fala a "verdade verdadeira" e, por isso, é apontado como louco pelos moradores da cidade do Sol, onde vive.

Sem vaidades e qualquer plano de carreira, Antenor é forçado pelo tio a ser bacharel, pois assim ele teria tudo nas mãos, bastava bajular um político-chefe para chegar a deputado.

Mas Antenor não queria. Ele era íntegro demais para fazer algo desse tipo. Porém, o homem apaixonou-se por uma filha da lavadeira de sua mãe e, para casar com ela, a moça exigiu que ele mudasse, que fosse igual aos outros.

Ao passar por uma relojoaria, Antenor resolve deixar sua cabeça para consertar e sai com uma de papelão.

Sua nova face mente, passa por cima de todos, trapaceia. E assim Antenor chega a deputado e seu nome é o mais indicado para o Senado. Decide-se casar com uma mulher de boa família, rica e despreza sua mãe, que, mesmo o achando louco, o protegia por sua bondade.

A moral da história nos traz uma reflexão interessante: “Cabeças e relógios querem-se conforme o clima e a moral de cada terra”.

Cleiton Rasga, Giselda Mauler, Sonia Praça e João Batista estão à frente da Companhia e convidaram Oberdan Junior, Carol Machado e Nando Cunha para o musical. Completam o elenco ainda os músicos-atores Guilherme Miranda e Gil Windsor, que conduzem as canções de Marcelo Alonso Neves, feitas exclusivamente para o espetáculo.

O Homem da Cabeça de Papelão se destaca pela sátira bem pensada de um dos maiores contistas do Brasil, Paulo Barreto. O jornalista usava inúmeros pseudônimos para escrever suas críticas. O mais conhecido é João do Rio.

Diferente do cinema, o teatro aceita bem um musical e João Batista soube dar o tom certo para o texto fluir da melhor maneira. Aliás, quem conhece o conto, percebe que pouca coisa foi mudada. Batista procurou ser fiel à história.

Serviço

O Homem da Cabeça de Papelão
Onde
: Teatro Café Pequeno
Duração: 60 min
Endereço: Av. Ataulfo de Paiva ,269, LeblonTelefone: (21) 2294-4480
Lugares: 120Horário: Quinta a sábado, 21h; domingo, 20h, até 1° de junho
Ingresso: R$ 25,00

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Gonzaguinha é homenageado pelo filho

Daniel Gonzaga canta músicas do pai em Comportamento Geral


O cantor Daniel Gonzaga, filho e neto de ícones da música brasileira, homenagea seu pai, Luís Gonzaga, em seu mais recente trabalho, Comportamento Geral.

Seu quinto CD é composto por 15 músicas de Gonzaguinha, algumas já bem conhecidas, como "Explode Coração" e "O que é o que é", e a inédita "Namorar". Ele foi gravado de uma maneira diferente, ao vivo, no estúdio, sem cortes e edições computadorizadas.

Dedilhando seu violão, Daniel fala sobre Comportamento Geral, sobre música e seu próximo trabalho.

Culturaetc. – Daniel, fale um pouco sobre Comportamento Geral.

Daniel Gonzaga – Diferente dos meus outros trabalhos, Comportamento Geral tem apenas músicas do meu pai. É um CD muito especial porque traz toda a minha família, em todos os sentidos. Primeiro porque eu estou cantando as músicas do meu pai e depois porque eu gravo com uma equipe que trabalha comigo há algum tempo e essa foi então a fotografia de um momento “Daniel enxergando o pai”.

Culturaetc. – Você tem um CD onde você faz uma homenagem ao seu avô, não é isso?

D.G. – Sim, é o meu terceiro CD. Então agora a minha família está fechada. E de agora em diante a gente pode se ocupar de projetos mais autorais.

Culturaetc. – E por que Comportamento Geral?

D.G. – Porque eu acho que a vida do Gonzaguinha, por si só, já foi um comportamento geral e porque a gente queria passar uma mensagem de cuidado com a comunidade, para ela não acreditar nos políticos e defender os seus próprios direitos, não com revolta, mas com inteligência, parar de trabalhar pelo bem do patrão, mas em benefício próprio, aproveitar os horários de preguiça e não os horários de trabalho, ser um cidadão melhor e parar de reclamar do próximo. Então Comportamento Geral é pra falar disso tudo com mais abertura.

Culturaetc. – Você sempre pensou em ser músico?

D.G. – Sempre, desde que eu me entendo por gente. Eu faço coro infantil desde os seis anos de idade, gravei com meu pai, com o Chico Anysio, Erasmo Carlos, comecei a tocar com doze, gravei o meu disco com 21 e é isso. Pra dizer que não pensei, eu fiz faculdade de jornalismo, estudei até o quinto período, mas com os shows não deu mais. Me sustento com a música desde os 18 e não dá tempo de ser outra coisa.

Culturaetc. – Você é sempre comparado com o seu pai e o seu avô? Como você lidá com isso?

D.G. – Comparações sempre rolam. A gente passa por isso o tempo inteiro, mas acho que o negócio não é saber se é melhor ou pior, mas apresentar uma proposta honesta e eu acho que isso é o que conta. Na verdade essa pressão deixou de acontecer há muito tempo porque eu não sucumbi a ela e eu já estou indo para um sexto disco. Então uso o meu tempo para trabalhar e não pra ficar pensando se estou fazendo certo ou errado. Acho que chegar aqui já é um índice de que estou fazendo as coisas certas. Esse tipo de pressão é pra quem está inseguro, pra quem não sabe seu caminho e eu sei bem o meu.

Culturaetc. – Como foi a escolha do repertório deste novo CD?

D.G. – Foi difícil porque o Gonzaga tem cerca de 400 canções e todas são boas. Então foram seis meses escutando bastante Gonzaguinha pra definir o que a gente queria fazer. Acabou que foi um pouco pelo coração e um pouco pelo que ele queria falar nas letras, pelo social.

Culturaetc. – E tem alguma que você aponte como a melhor composição, a melhor canção?

D.G. – Não dá, é impossível, é muita coisa. Às vezes você gosta de uma em um determinado momento e de outra num momento totalmente diferente. É difícil você apontar uma melhor canção. Tanta coisa fez parte da minha vida, nos shows, no dia-a-dia, ao vê-lo compondo, então não dá pra ter essa preferência.

Culturaetc. – Como foi a experiência de gravar um CD ao vivo, no estúdio, sem cortes e edições?

D.G. – A gente passou por um período de tanta limpeza digital que as pessoas esqueceram que elas são falhas, ficam roucas, têm problemas, o violão desafina. Então a gente quis passar essa atmosfera para o público, de um show controlado, sem público – é muito chato a gravação para quem está escutando – , e a gente queria passar essa noção de um artista cantando mesmo. Quem ouve o disco pode ter essa sensação de ter um show em casa e isso faz ele ficar parecido com o disco, que ficou mais original, com uma cara mais moderna. A gente não mudou nada. Tudo o que foi feito ali é de verdade, sem adicionar nada depois.

Culturaetc. – Como está essa questão de apoio cultural, de gravar um CD?

D.G. – Gravar CD é mole, é simples. Com um computador em casa hoje você grava um CD. Mas depois vem a questão da grana para você divulgar este CD e eu acho que o maior problema está aí, por conta das emissoras de rádio e de televisão. É muita demanda, tem muita gente gravando. A gente vive uma fase muito feliz devido à democracia tecnológica e por isso se torna fácil gravar CD. Eu acho que a gente, enquanto cidadão, precisa procurar outros caminhos, na internet, na televisão, nos jornais, parar de ouvir sempre as mesmas coisas, procurar abrir a cabeça para o novo, que está chegando, para as novas bandas, os novos artistas, os novos compositores. E também não acho que a gente está vivendo uma crise da música, como dizem os jornais. Eu não acredito nessa crise da música porque tem muita gente compondo muito bem. A crise está mais nesse hiato que a gente está vivendo de não saber para onde vai a TV digital, que foi modelo imposto pelo nosso queridíssimo Ministro das Telecomunicações, totalmente guiado por outra emissora, o MP3, a mídia do disco, o que vai acontecer com ela, se é pirataria, se não é... Mas a música brasileira está muitíssimo bem. Então tem muita coisa que entra nessa discussão de como é gravar um CD, pra que serve um CD. O objetivo é fazer o cidadão se conscientizar de que ele é o grande fomentador dessa música que acontece no Estado, no país, parar de comprar disco pirata na rua, não por uma questão de moral e de ordem, até porque eu sou contra, mas por uma questão de que, se você compra CD pirata, você não pode reclamar que existe uma produção, pois você está furando uma produção que acontece. E até mesmo parar de comprar CD pirata para alimentar os artistas que estão fazendo novas coisas.

Culturaetc. – Você acredita que as gravadoras estão perdendo o seu império e por isso são contra o download de músicas?

D.G. – As gravadoras já quebraram. Elas temem perder o controle da música, mas isso é uma coisa impossível de se frear. O objetivo hoje é anexar um outro valor à música e isso vai fazer o compositor trabalhar cada vez mais, pois ele vai poder gravar seu CD em casa e lançar na internet. E estimular também o uso consciente disso. A gente tem é que ser mais cidadão, em todos os sentidos.

Culturaetc. – Como está o processo do seu 6° CD?

D.G. – A gente lança um disco e já começa a trabalhar o próximo. Estou com umas 35 músicas inéditas e agora entra o processo de seleção, concepção do disco, para onde você quer levar, o que você quer dizer, quais são as músicas que você acha que têm que entrar, quais as músicas que, dali, vão para outros compositores etc. Então eu estou nesse trabalho de seleção, vou começar a gravá-las em casa e fazer toda a pré-produção, que é definir qual o arranjo que eu quero, que instrumentos vão entrar. Feito este trabalho, que demora cerca de um ano, a gente entra em estúdio para começar a gravar. as o processo de gravação vai ser muito semelhante a este disco. A gente vai gravar tudo ao vivo também, com uma dinâmica de gravação diferente. Não quero gravar mais nada separado, quero ser mais original.

Para saber mais sobre Daniel Gonzaga, basta entrar no site do cantor: www.danielgonzaga.com.br.



Crítica: Estômago


Culinária, paixão, crime e poder. Esses são os principais ingredientes de Estômago, uma tragicomédia que estreou nesta semana e já aculuma oito prêmios, inclusive o de Melhor Filme do Festival 2007.

Raimundo Nonato sai do Nordeste em busca de uma oportunidade melhor. Na cidade grande, assim que chega, consegue o emprego de cozinheiro, após beber e comer de graça em um boteco.

A partir de então, descobre seus dotes culinários, garante uma boa clientela para o boteco, arruma uma namorada – a prostituta Íria – e ainda é convidado para trabalhar em um restaurante italiano.

Contando assim parece um filme sobre superação, mas está longe disso. Nonato comete um crime e o filme intercala cenas dele na cadeia e na cozinha. Mas o público só sabe qual crime ele cometeu na última cena.

Nonato é João Miguel, um talentoso ator baiano que, por sua ótima atuação, ganhou o prêmio de Melhor Ator do Festival do Rio 2007, também conquistado em 2005 por Cinemas, Aspirinas e Urubus.

Para quem estreou em um longa, Fabiula Nascimento incorporou a prostituta gulosa Íria como ninguém.

Babu Santana, que também está nos cinemas com Maré, Nossa História de Amor, é Bujiú, chefe da cela onde Raimundo está preso, mas que logo cai nas suas graças por seus dotes culinários. Integrante do Nós do Morro, o ator, que estreou em Cidade de Deus, ganhou o Prêmio Especial do Júri do Festival do Rio 2007 por sua atuação nos dois filmes.

A direção de Estômago fica por conta do estreante em longas, Marcos Jorge. E que estréia! O filme conquistou quatro prêmios no festival do Rio 2007: Melhor Filme pelo Público, Melhor Diretor, Melhor Ator e Prêmio Especial do Júri. Pela Europa, recebeu ainda o prêmio Lions Award e foi o segundo colocado, entre 200 longas, na preferência do público, no Festival Internacional de Rotterdam, na Holanda. O filme conquistou também o Festival Internacional de Punta Del Este, no Uruguai, com os prêmios de Melhor Filme e Menção Especial de Melhor Ator e foi apontado como melhor filme latino-americano no Festival Cinematográfico do Uruguai.

Destaque para a direção musical de Giovanni Venosta, que deu um tom especial para as cenas em que Nonato cozinhava. Ele fazia seus pratos como um regente orienta seus músicos em uma ópera.

O filme foi inspirado no conto “Presos pelo Estômago”, do livro Pólvora, Gorgonzola & Alecrim, de Lusa Silvestre, que assina o roteiro. Trata-se de uma obra instigante que veio como uma sátira a esse mundo antropofágico que vivemos, onde homens se devoram a troco de nada e os dotes de Raimundo servem para mostrar um pouco as artimanhas que usamos para chegar ao poder.

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Estômago
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 112 minutos
Direção: Marcos Jorge
Roteiro: Lusa Silvestre, Marcos Jorge, Cláudia da Natividade e Fabrizio Donvito, baseado em argumento de Lusa Silvestre e Marcos Jorge
Produção: Cláudia da Natividade, Fabrizio Donvito e Marcos Cohen
Música: Giovanni Venosta
Fotografia: Toca Seabra
Direção de Arte: Jussara Perussolo
Figurino: Marisol Grossi
Edição: Luca Alverdi

Elenco
João Miguel (Raimundo Nonato)
Fabiula Nascimento (Iria)
Babu Santana (Bujiú)
Carlo Briani (Giovanni)
Zeca Cenovicz (Zulmiro)
Paulo Miklos (Etecetera)
Jean-Pierre Noher (Duque)
Marco Zenni (Vagnão)
Marcel Szymanski (Valtão)
Helder Clayton Silva (Seqüestro)

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Trilogia Carioca

Alexandre Pessoal, Maninho Lima e Bruno Ceará

Banda começou de forma despretensiosa e hoje lota as casas por onde passa
Três amigos, cada um com sua banda, resolvem juntar seus talentos e formar um grupo, sem se desligar de seus trabalhos. Mas Alexandre Pessoal (ex-integrante da banda Nada Pessoal), Bruno Ceará (ex-integrante da banda Seu Cuca) e Maninho Lima (ex-integrante do grupo Deu Branco) viram que a coisa foi tomando forma e resolveram investir no Trilogia Carioca.

O grupo passeia do samba à MPB, tem um vasto repertório que vai de Marisa Monte a Jorge Ben, Seu Jorge a Fundo de Quintal, além de suas próprias composições.

Em um bate-papo animado, o trio fala sobre sua formação e projetos para seu primeiro CD.

“Cada um tinha um trabalho separado, mas a gente era muito amigo e sempre dava uma canjinha no show do outro. Então a gente resolveu se juntar, mas sem largar seu projeto. Desses encontros surgiu uma cara para o trabalho. Começamos a nos apresentar oficialmente e resolvemos nos assumir como banda. E o Trilogia nasceu do crescimento dessa coisa despretensiosa que a gente fez”, explica Alexandre Pessoal, voz e efeitos.

Os três se orgulham em dizer que nunca se aproveitaram do conhecimento de ninguém para tocar em algum lugar. Alexandre, por exemplo, é filho de Erasmo Carlos, mas faz um trabalho independente e diferente do pai.

“A gente conhece muita gente, mas mesmo assim nunca tivemos um padrinho para tocar na Lapa, por exemplo. Isso nunca foi fator determinante. Tudo que conseguimos foi por mérito nosso. A Lapa é um mercado extremamente fechado e ainda assim tocamos para 8 mil pessoas na Fundição Progresso”, se orgulha Ceará, voz e violões.

E de pensar que, com exceção de Alexandre, a música entrou por acaso na vida deles.

“Nunca pensei em ser músico. A profissão surge na vida de cada um muito cedo, mas a música nunca é a primeira opção, até por ser colocada um pouco à margem da sociedade. Caí na música por diversão. Um grupo de amigos do pré-vestibular tinha banda, tocava samba e aí resolvi tocar e deu no que deu”, conta Maninho, voz, cavaquinho, violão e pandeiro.

Já são três anos de formação. O grupo começou, oficialmente, em abril de 2005 e agora trabalha para lançar seu primeiro CD.

“A gente começou a fazer a pré-produção. Como os três compõem estamos analisando o repertório, o que é bom pra banda. Estamos encontrando uma cara ainda para o CD, que deve sair ainda neste ano”, adianta Alexandre.

Mas enquanto o CD do Trilogia Carioca não sai, o público pode conferir o trabalho do grupo no bar Bom Sujeito, na Barra da Tijuca, onde eles tocam de 15 em 15 dias, e aos domingos na MELT, no Leblon.

Em breve, no site http://www.trilogiacarioca.com.br/ os internautas poderão também baixar suas músicas.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Crítica: Maré, Nossa História de Amor

Cena do Filme. Foto de Bruno Prada
O clássico Romeu e Julieta não podia ter ganhado uma versão melhor. William Shakespeare deve estar aplaudindo até agora ao brilhante musical de Lúcia Murat, Maré, nossa história de amor, inspirado em uma das mais belas e trágicas histórias do dramaturgo inglês.

Com estréia marcada para esta sexta-feira, 4 de abril, Maré é uma prova de que o cinema nacional está mais rico do que nunca. Trata-se de um belo musical, colorido, composto pelos mais talentosos dançarinos de diversas comunidades do Rio de Janeiro, além de diálogos inteligentes e um roteiro bem amarrado.

O filme, assim que começa, nos dá uma vontade de levantar da poltrona e dançar junto com o elenco. A trilha sonora, assinada por Fernando Moura e Marcos Suzano, e as coreografias, assinadas por Graciela Figueroa, casaram tão perfeitamente quanto o figurino de Inês Salgado e a fotografia de Lúcio Kodato.

Lúcia Murat esteve impecável ao mostrar uma favela repleta de jovens sedentos por arte, por fazer arte, pela dança. É claro que há o lado das facções e de toda aquela disputa por pontos de vendas de drogas, mas isso fica como coadjuvante. O protagonista, o fator chave do filme é ela, a dança, o hip hop, o funk.

Falando em protagonista, o “Romeu” da trama é Vinícius D’Black, o Jonathan, dono de uma bela voz e com um gingado de quem está nessa a vida inteira. Sua “Julieta” é Cristina Lago, que foi feita para ser Analídia, uma jovem doce e determinada, movida por seu amor pela dança e por Jonathan.

Os jovens pertencem a diferentes facções criminosas na favela da Maré. Jonathan é irmão de um dos chefes do tráfico, Dudu, muito bem interpretado por Babu Santana, que inclusive ganhou o Prêmio Especial do Júri no Festival do Rio 2007. Apesar de viver na criminalidade, Dudu chora, apóia a carreira do irmão e ainda sustenta a escola de dança, liderada pela professora Fernanda, interpretada por Marisa Orth.

Já Analídia é filha do chefe de outra facção, sob o comando de seu primo, Bê (Jefchander Lucas), muito mais impiedoso que Dudu. Da cadeia, o pai da moça é quem alimenta seu bando com armas e munição.

Maré, nossa história de amor mostra uma outra realidade das favelas. Uma realidade quase escondida por uma sociedade que prefere acreditar, talvez por falta de informação, que lá só tem lugar para o tráfico, que não há qualquer tipo de manifestação cultural.

Lúcia Murat acertou em cheio e, sem dúvida, está na sua melhor fase.

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Maré, Nossa História de Amor

Equipe

Direção: Lucia Murat
Direção de Fotografia: Lucio Kodato
Direção de Arte: Gringo Cardia
Roteiro: Lucia Murat e Paulo Lins
Coreografia: Graciela Figueroa
Coreografia adicional: Sonia Destri
Direção Musical: Fernando Moura e Marcos Suzano

Elenco

Cristina Lago: Analídia
Vinícius D'Black: Jonathan
Marisa Orth: Fernanda
Babu Santana: Dudu
Jefchander Lucas: Bê
Anjo Lopes: Anjo
Elisa Lucinda: Maria, mãe de Analídia
Malu Galli: Amiga de Fernanda
Flavio Bauraqui: Paulo

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Boca Livre 30 anos


Um dos vocais mais importantes do país lança seu primeiro DVD
O grupo Boca livre está comemorando 30 anos e, como presente, lançou seu primeiro DVD, “Boca Livre ao Vivo”.

Com participações de Rodrigo Maranhão, Roberta Sá, do grupo MPB 4 e outros, um dos melhores vocais do país relembra os sucessos “Toada”, “Mistério” e “Bicicleta”, além de novas composições.

Em um bate-papo descontraído, David Tygel (violão e vocal) falou sobre o novo trabalho, parcerias e, é claro, sobre os 30 anos de Boca Livre.

David Tygel - É muito legal um grupo conseguir se manter por 30 anos, sem só se repetir. Estamos sempre trabalhando músicas novas, sem saudosismos. É claro que a gente toca músicas que nosso público gosta, mas procuramos diversificar.

Culturaetc. – Durante esses 30 anos vocês tiveram três formações diferentes. Como foi isso?

D.T – O Boca Livre é um estado de espírito. Quem está dentro, está, quem está fora, não está, mas não houve brigas. Na verdade as pessoas estavam dispostas a fazer outros trabalhos. Eu mesmo fiquei 12 anos fora pra fazer trilhas para cinema e até ajudei a arrumar outro integrante. E a gente aproveita para trazer essa vivência de fora para o grupo.

Culturaetc. – E como foi escolhido o repertório do DVD “Boca Livre ao vivo”?

D.T – É uma mistura entre as músicas conhecidas, que nunca tinham sido gravadas em DVD, e também de músicas novas, que foram acrescentadas no repertório, como as do Edu Lobo, que é um grande parceiro nosso.

Culturaetc. – Você sente muita diferença entre o cenário musical de 30 anos atrás e o de agora?

D.T – Naquela época havia muita coisa bacana, como a espontaneidade. As rádios tocavam o que quisessem. Os programadores tinham muita liberdade. Hoje existe uma pressão econômica muito grande em cima daquilo que tem que fazer sucesso. Eu acho que hoje é mais difícil para toda a produção brasileira chegar sequer a tocar em alguma rádio. A programação hoje toca 1% do que se é produzido no país. Os outros 99% não chegam. Essa é a maior diferença hoje.

Culturaetc. – E qual seria a solução para isso?

D.T – A solução seria a democratização dos meios de comunicação. Há projetos, em todos os Estados, que facilitam o encontro dessas novas produções com o público, que está louco para ver coisas novas. Talvez, com isso, apareçam gravadoras menores, e até mesmo mais lojas ou pontos diferentes de vendas de CD, mais shows, etc.

Culturaetc. – Falando em projetos, o Boca Livre, há 30 anos, fez parte do primeiro Projeto Pixinguinha, que difunde música pelo país. Como foi essa experiência?

D.T – Foi muito legal, pois um projeto como esse permite que muita gente conheça novos valores. No nosso caso é bom que as pessoas conheçam o Boca Livre de graça. Por que não? Não sei se a gratuidade é a solução, mas se diminuir, por exemplo, o preço do CD, diminui a produção pirata.

Culturaetc. – Vocês tiveram muitas parcerias ao longo desses anos. Existe alguma que você aponta como a que mais gostou?

D.T – A gente tem importantes parcerias, como o Geraldo Azevedo, que é meu amigo de muitos anos, então cantar com ele é maravilhoso, assim como o Paulinho Moska. Tem muita gente boa por aí.

Culturaetc. – Como você define esses 30 anos de Boca Livre?

D.T – Defino esses 30 anos com o maior prazer. Superamos as diferenças de uma maneira muito legal. Hoje somos amigos, parceiros, e são pessoas que ainda tenho muito pra trocar.